sexta-feira, 13 de julho de 2012

Uma servidora pública real

Walêska Dayse Dias de Sousa*

Sou uma mulher muito comum na atual realidade brasileira: separada e casada pela segunda vez, responsável pela educação dos três filhos do primeiro casamento, trabalhadora, salarialmente responsável pela maior parte das despesas domésticas, enfim, um perfil da mulher do nosso tempo. Que batalha, ama, luta pela sobrevivência, busca o melhor para os filhos, se dedica a uma construção de parceria numa nova relação homem-mulher e ainda sonha com uma sociedade em que palavras como justiça e igualdade não sejam apenas ideais distantes e pouco prováveis num contexto capitalista.

Sou assim, como diriam, uma Maria de nome diferente entre tantas que acumulam responsabilidades de ordens diversas, como as mulheres fazem tão bem, pagando um preço alto pelas escolhas feitas, em prestações a se perder de vista.

Também sou uma servidora pública federal. Uma escolha feita com o objetivo de tornar a vida mais segura diante dos ditames do capital privado, em que um dia se está empregado, no outro desempregado, mesmo com uma excelente qualificação profissional. Afinal, com três filhos, é preciso um mínimo de segurança para conviver nesse mundo de disputas, de concorrências nem sempre justas, de sol para poucos, mesmo quando se acredita ser possível mudar a lógica, romper com as verdades absolutas, transformar a si e ao mundo.

Sou servidora pública federal por ter escolhido fazer parte de um projeto coletivo de construção de uma universidade pública, gratuita e de qualidade. A universidade da minha cidade natal – Uberaba: a jovem Universidade Federal do Triângulo Mineiro – UFTM que conta atualmente com sete anos de existência.
Nos últimos cinco anos tenho procurado contribuir com a construção da UFTM. Nesse pouco tempo, presenciei projetos serem gerados, participei do nascimento de cursos, recebi pessoas de longe e de perto, experimentei vivências democráticas e outras nem tanto, usei minha voz, me mostrei com inteireza, coragem, compromisso, responsabilidade.

Ao mesmo tempo, continuei cultivando meus ideais. Continuei acreditando que é possível ter valor enquanto pessoa e profissional, é possível superar a fragmentação dos conhecimentos da academia em defesa de um todo, de uma integração, de um projeto que congregue diferenças sem se esfacelar em pedaços sem diálogo entre si.

Assim tenho gerido minha vida: com esforço, trabalho, sacrifícios. Tenho como retorno uma remuneração nem sempre condizente com minhas necessidades pessoais e familiares, com minha busca permanente por melhor formação.

Não tenho espaço para guardar dinheiro em lugares obscuros, não tenho investimentos no mercado de ações, não possuo imóveis para exploração no mercado imobiliário. Tenho, na maior parte das vezes, o mínimo necessário para custear uma vida modesta, digna. Algumas vezes, um mínimo nem sempre suficiente, tendo em vista a permanente vontade de ter uma melhor qualidade de vida. Qualidade que custa caro e obriga a enfrentar o caminho dos financiamentos, a romaria das instituições financeiras.

Nada muito diferente da grande massa da população brasileira, que também se equilibra como pode, procurando sobreviver com dignidade e ainda manter o sorriso nos lábios, a crença, a fé na vida, como só esse povo sabe fazer.

Por isso a legitimidade da luta atual. Por isso a greve que se instala em 95% das universidades brasileiras. Luta que revela pessoas, como eu, que querem ser ouvidas, que merecem respeito e que ainda não tiveram suas reivindicações postas numa mesa de negociações. Negligenciadas, ignoradas.

Às necessidades, a resposta tem sido o silêncio. Ao pedido de olhos nos olhos, a meia resposta tem sido endereçada para parte da imprensa, no pouco espaço que dedica ao movimento. No chamado para o diálogo, a resposta da medida unilateral, a pressão do corte no ponto, rasgando direitos constitucionais, fragilizando o Estado democrático.

E a qualidade do serviço público em educação e saúde fica comprometida. Presente e futuro de filhos meus e de outras Marias também.

Como não posso desistir, vou em frente. Reunindo minha indignação com a esperança, minha força de mulher com a intenção das ações concretas. Minha vida simples de trabalho como meu mais precioso legado aos que amo e que estão sob minha responsabilidade.

Às mulheres que comandam a nação quero dizer: sou parte desse país que se diz de todos. Respeitem a minha voz e a minha vez.

* Walêska Dayse Dias de Sousa é pedagoga, doutoranda em Educação pela UFU e servidora da UFTM há cinco anos (11/07/12).

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